A avó

Por Gisele Silva

Seu colo farto, macio e acolhedor. Sua pele negra, seus olhos negros azulados como pedras preciosas. Olhos que pareciam ler nossa alma e nossos desejos mais profundos.

Seus cabelos crespos, compridos com alguns fios brancos como raios de luar formavam um lindo penteado cujas tranças se cruzavam no alto da cabeça. Seu rosto irradiava bondade e sabedoria.

Quando cozinhava o aroma gostoso da comida se espalhava por toda a casa chegando até o quintal e às casas dos vizinhos mais próximos. E eles vinham quase como se estivessem flutuando. Os biscoitos eram para as crianças. Os ensopados, a carne seca e o queijo (curados por ela mesma) eram para os adultos.

As pessoas faziam questão de estarem reunidos à sua volta. O acolhimento naquela casa de cômodos amplos era o lema da família.

Filhas, genros e netos a mimavam como se criança fosse. Todo cuidado e amor com a bela matriarca que de todos cuidava com zelo. Ficou cega devido à diabetes, mas isso nunca a impediu de fazer o que gostava e queria.

Lavava roupas, as punha para quarar espalhadas pelo quintal. As pendurava, bem branquinhas, no varal.

Francisca era seu nome, mas todos a chamavam “Dona Chiquinha”.

Cuidava da casa e da neta pequenina e levada. Dava-lhe banho, comida na boca.

Ralhava com a menina que teimava em subir na amoreira e comer as frutas ainda pequeninas e verdes.

Receitas secretas tinha Dona Chiquinha. Um bolinho frito, feito com fubá para acompanhar um café fresquinho no final da tarde. Contava as histórias de quando era criança no interior de minas gerais.

Os netos em roda, sentados no chão, aos pés da velha senhora, se deliciavam com a voz doce e meio rouca, imaginando as cenas dos casos que ela contava. Sonhavam em viver aquelas aventuras, passear pelas paisagens que pareciam encantadas.

 A ancestralidade que marca infâncias, lembranças boas de tempos idos.

A avó, uma memória, uma força, uma história.

---

Autoria

Gisele Silva é Pedagoga que atua com professoras e alunos de uma Escola Especial para Autistas em São João de Meriti. Professora dos anos iniciais na cidade do Rio de Janeiro. Pós Graduada em Alfabetização das Crianças das Classes Populares pela UFF. Faz parte do Coletivo “Encantadores de Letras”. Autora do Projeto “Caixa de Encantamentos” que incentiva a leitura, estimulando a percepção, a imaginação e o fazer criativo. Iniciou o caminho como escritora em 2019 publicando 3 livros de literatura infantil e participando com dois textos na coletânea "Vozes Negras: tecendo a resistência".