Por Fabiana Esteves
Ela me pergunta com ares de melancolia porque insisto nas correntes adolescentes que a privam de viver assim um pouco mais intensamente. Usou brilhantemente a palavra autonomia no seu sentido mais amplo. E como a personagem do livro do Carpinejar, desejou apagar as velas do seu próprio bolo sem que eu, a mãe, corresse e soprasse na frente.
(Será mesmo que não deixo que ela cresça?)
Eu repito que o ventre livre não livra de todos os perigos desta vida, eu não me sinto pronta para parar de lamber a membrana gelatinosa que cobre seu corpo miúdo, ainda não ofereci o copo para começar o desmame, meu peito ainda jorra o leite mais nutritivo do mundo - ela sabe que desprezo as frases longas demais e repletas de vírgulas nos entremeios- mas respondo em prosa que é a escrita que ela gosta de ler. Tento, embora não me seja natural.
Nem me atrevo a reescrever
O Mundo é o Moinho
(Meus versos não tem a cadência perfeita do mestre Cartola)
Acho que ela percebeu
Que o medo dela
Também é o meu
Embora sejam medos diferentes, os dois aceleram o coração, deixam a boca seca e o pulmão buscando um ar que não vem.
Eu sei. Eu sei de tudo isso. Eu entendo? No meu tempo era diferente (estou dizendo isto?)
A palavra ficou suspensa no ar quente do quarto que vive trancado.
Afinal
São sombrios os tempos
São sombrias as ruas
São fugazes as paixões
E instáveis as estações
Fabiana Esteves com suas filhas Ísis e Laís.
Autoria
Fabiana Esteves é Pedagoga formada pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNiRIO) e Especialista em Administração Escolar. Trabalhou como professora alfabetizadora na Prefeitura do Rio de Janeiro e no Estado do Rio com Educação de Jovens e Adultos. Trabalhou como assessora pedagógica e formadora nos cursos FAP (Formação em alfabetização Plena) e ALFALETRAR, ambos promovidos pela Secretaria de Educação do mesmo município. Também foi Orientadora de Estudos do Pacto pela Alfabetização na Idade Certa, programa de formação em parceria do município com o MEC. Em 2015 coordenou a Divisão de Leitura da SME de Duque de Caxias (RJ). Atualmente, é Orientadora Pedagógica da Prefeitura de Duque de Caxias, onde tem se dedicado à formação docente. Escritora e poeta, participou de concursos de poesia promovidos pelo SESC (1º lugar em 1995 e 3º lugar em 1999) e teve seus textos publicados em diversas antologias pela Editora Litteris. Escreve para os blogs “Mami em dose dupla” e “Proseteando”. Publicou os livros “In-verso”, "Pó de Saudade", "Maiúscula", "A Encantadora de Barcos" e "Coisas de Sentir, de Comer e de Vestir". É mãe das gêmeas Laís e Ísis.
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